quarta-feira, 30 de maio de 2012

Dona bruxinha de La Ubatuba

Dona bruxinha de La Ubatuba

Publicado em 24/05/2012 às 17:13 por Silvio Bonfiglioli.
Recomende esse textoCompartilhe essa páginaTweet esse textoCompartilhe no Orkut

Tivesse eu o dom da escrita como tinha Miguel de Cervantes, estaria agora escrevendo a terceira parte do romance por ele escrito em 1605 e 1615, onde narrou as incursões de Don Quixote pelas terras de La Mancha, de Aragão e de Catalunha, e finalizaria agora em Ubatuba.
Mesmo não tendo este dom, não posso me furtar a relatar aqui está ultima incursão, agora na forma feminina e pelas terras de Coaquira. Como Don Quixote, muitos achavam que ela tinha perdido a razão pelas agruras da vida. Ela efetuou varias incursões pela cidade, sempre defendendo aquilo que achava certo, se envolveu em uma série de polemicas, mas suas aspirações sempre foram desmentidas pela dura realidade.
As suas frustações acabaram por enfraquecer o seu já desnutrido e enfraquecido coração, e no dia 25 de dezembro de 2011, justamente no dia de Natal ela foi acometida de um infarto, e encaminhada para a Santa Casa. Os médicos conseguiram mantê-la viva e após alguns dias obteve alta, com a recomendação de não fazer esforços físicos e muito menos passar nervoso.
Ela que quebrou varias lanças contra os moinhos de ventos da Câmara Municipal, quebrou lanças para proteger os animais abandonados nas ruas de Ubatuba, não seguiu as recomendações médica e se pós a batalhar pelo seu sustento e convicções, pedalando seu triciclo, ou melhor, seu cavalo Rocinante, protegida pelo seu chapéu de ponta estilo bruxa, que na verdade era seu elmo, e o seu vestido comprido que com certeza era sua armadura. Eu e minha filha MIMI, às vezes dávamos uma de fiel escudeiro, e acompanhávamos seus passos, levando seus cachorros para castrar, atendendo algumas demandas urgentes, levantando sua moral, e principalmente tentando mostrar a realidade, exatamente como Sancho Pança.
Como D.Quixote e seu cavalo Rocinante, a nossa D. Bruxinha e seu triciclo nunca foram levadas a serio, suas atitudes sempre foram consideradas grotescas e até motivo de piadas e pilherias. Finalmente no ultimo dia 21 de maio (segunda feira), às cinco e meia da manhã, a MIMI recebeu um telefonema da Santa Casa informando que a Dona Maria Elizabeth, mais conhecida como Bruxinha, havia falecido acometida de outro infarto, agora fulminante, e ela tinha que reconhecer o corpo. Deixou uma filha de 26 anos, uma neta de 2 anos e 15 cachorros. Foi velada no velório Municipal no Bairro do Ipiranguinha e sepultada às 16 horas do mesmo dia, no cemitério Bela Vista. Por tratar-se de pessoa com parcos recursos, a Prefeitura através da Secretária Municipal de Cidadania e Desenvolvimento Social arcou com as despesas, a Funerária Litorânea forneceu o ataúde e como de costume cuidou prontamente e eficientemente do féretro.
A história de D.Quixote foi redigida sob a forma de novela realista, e ele ao regressar a seu povoado, percebe que não é um herói, e também percebe que na verdade não existem heróis, o que deve existir são atitudes em busca da justiça social. Ela agora que com certeza foi recebida de braços abertos por Deus, que ao contrario de nós mortais, sabe reconhecer as virtudes humanas, também já percebeu que suas lanças quebradas não foram em vão, lutou por aquilo que considerava certo e sem duvida teve muita atitude, por isso merece toda a nossa admiração e homenagem. Adeus Dona Bruxinha de La Ubatuba, nós vamos sentir sua falta

sexta-feira, 11 de maio de 2012

RECORDAÇÕES DE UMA MÃE





                “Ao meu filhinho querido. Quando estas folhas já estiverem amareladas pelos anos e se Deus quiser tu fores um homem, passe os olhos por estas paginas e lembraras de tua mãe. Com todo amor e carinho Thereza”.

                 Com estas palavras a minha mãe inicio o relato do que ela considerou os principais momentos de minha vida. Hoje, exatamente como ela profetizou, as paginas já estão amareladas eu sou um homem e a lembrança se mistura a saudades e produz uma dor no coração que reflete na alma.

                  Muito mais do que está escrito, consigo ler as entrelinhas, consigo identificar os momentos em que seu coração estava triste ou alegre. Quando relata pormenorizadamente, o dia e hora do meu nascimento (18/04/49 as 3,20 h), uma segunda feira chamada de pascoeta, pesando 4 quilos e 200 gramas, ou a primeira viagem à praia (São Vicente), no dia 22 de abril de 1950.

                  Percebo o grande cuidado que ela teve para dar mais ênfase aos bons momentos, deixando de entrar em detalhes nos mais tristes. Mas no dia 25 de março de 1952, o medico da família, Dr. Vicente D´Amato, diagnosticou que ela estava com “esgotamento nervoso”, acho que hoje seria depressão. “A mamãe tinha tanto nervoso e fraqueza, que não podia ouvir barulho, você chorar, correr, tudo parecia que estava dentro da cabeça da mamãe”.

                   Conseguiu se recuperar depois de vários meses de tratamento, e continuou a escrever, agora mais espaçadamente, e parou no dia 25 de dezembro de 1961, (Natal). Ela me chamou e entregou o livro com suas recordações dizendo que agora eu já podia se quisesse continuar a escrever, coisa que eu nunca fiz.

                   Na minha juventude e adolescência, eu nunca dei muita importância a estas anotações, mas com o passar do tempo, percebi o grande amor que ela transmitia na narração e como é importante saber dos detalhes da própria vida e de seus familiares. Os casamentos dos tios, o nascimento dos primos, o batizado, a primeira comunhão, a data da caxumba, da tosse comprida, da operação das amidalas e suas aflições, as viagens, as festas, os presentes, os costumes da época, o exame de admissão ao ginásio, à copa de 58, quantas coisas importantes aconteceram, quantos ensinamentos, que se ela não tivesse perpetuado nas suas recordações estariam perdidas no tempo.

                   Dentro deste livro de recordações encontrei uma folha de caderno com um poema que escrevi na escola e dei para ela no dia 11 de maio de 1958, que agora volto a oferecer a minha saudosa mãe, e a todas as mães que tiveram a paciência de ler está coluna e principalmente a Marli, minha amada esposa e mãe dos meus filhos. “Minha mãezinha eu gosto de ti/ E neste dia que é teu vou cantar/ Este versinho com todo carinho/ Para dizer quanto quero te amar/ E as palavras de nossa canção/ Guarda mãezinha no teu coração”.

Feliz dia das mães.

                       SILVIO BONFIGLIOLI

                    s.bonfiglioli@hotmail.com